Atualmente vivenciamos a deterioração nas relações humanas. Enquanto houver
impunidade e o acabrunhar autorizado por meio de discursos falaciosos e
oportunistas que incitam e fazem aflorar nos sujeitos todas as formas de
preconceito e discriminação, inexistirá consciência do valor da vida humana.
Assim, presenciamos a inversão de
valores humanos na sociedade contemporânea. Estamos diante de uma sociedade
pacífica e inerte que aceita como normal os inúmeros ataques ao seu semelhante,
sem se dar conta de que, quando se é formulada uma justificativa para ações
incoerentes e desproporcionais ao agravo sofrido, contribuímos direta e
indiretamente com a propagação da violência, seja ela de ordem física, moral ou
psíquica.
Os atos que buscam ofender e/ou
desmoralizar e/ou oprimir e/ou excluir e/ou chacotear e/ou chantagear e/ou
invadir a privacidade e/ou eliminar o próximo, sejam cometidos de forma
explicita e/ou implícita, perfazem as inúmeras faces da violência.
Dito isso, observa-se de que não
poucas vezes aceita-se como normal uma “brincadeira” quando na verdade ela
representa o rebaixamento de uma pessoa ou de uma determinada parcela da
sociedade. Todavia, quando ocorre um ato em grandes proporções como é o caso de
atentados, nos quais as mortes se dão de forma trágica e inesperada, a
sociedade clama por segurança, justiça e busca apontar culpados. Neste caso
todos entendem de que não se trata de mera “brincadeira”.
Se o que diferencia o ser humano
dos animais é a capacidade de raciocinar, onde está a coerência entre o ato “brincadeira”
e o “trágico”? Quantas tragédias serão necessárias até que os “humanos”
compreendam de que todo infortúnio é acompanhado de prenúncio?
A ambição pelo poder não pode e
não deve sobrepor os valores humanos. Pecamos, erramos e somos cumplices quando
nada fazemos para assegurar o convívio harmônico entre os “humanos”. A omissão
de buscar compreender o outro e de não respeitar todas as formas de diferenças
que há entre os seres humanos favorecem o surgimento de fatalidades.
Cada indivíduo de um modo ou de
outro, de um momento para outro pode explicitar uma forma de comportamento
reprovável aos padrões societários da época. Todavia, sob esse prisma, quando o
sujeito encontra terreno fértil e seguro para expor aquela espécie
comportamental, torna-se desumano e cruel. É capaz de matar para fazer valer a
sua forma de pensar e agir.
Frente ao exposto compreende-se
de que inexiste tão somente a violência por meio de instrumentos letais. São
inúmeras as formas de cometimento de atos agressivos. Assim sendo, nota-se de
que, atualmente, é necessário aprofundar o estudo sobre as diversas faces da
violência velada, pois é por meio de atos considerados como “brincadeira” e/ou “normais”
que decorrem os grandes espetáculos de sangue e dor.
Não basta apenas ficar atônico e
baixar a guarda para ser solidário a dor de seu semelhante diante de uma
desgraça dita, em muitas vozes, “inesperada” que em verdade já vinha sendo
arquitetada e anunciada. Atos violentos comovem, mas dificilmente promovem a
reflexão dos sujeitos dentro da sociedade.
Da forma como está estruturada a
sociedade atual, ela não é mais nem menos de que uma junção de diversos grupos
que pensam e agem de forma diversa, sem compromisso com o todo. São inúmeras “irmandades”
que julgam deter a “verdade absoluta”. Seus membros, intolerantes e agressivos,
buscam nesta agremiação demonstrar poder e domínio.
É imprescindível a aprendizagem a
partir dos próprios erros. O mundo atual está numa UTI. Enquanto não houver
solidariedade e compaixão pelo semelhante no lugar da defesa e justificativa de
que este ou aquele ato é permissível porque determinado sujeito discursa que é
a melhor forma para evitar danos maiores, continuaremos contribuindo para o
extermínio da raça humana. A palavra do momento é reflexão para, assim, buscar
uma convivência harmoniosa e livre da imposição de paradigmas.